terça-feira, 3 de abril de 2012

Contratempos 2




  Um dia, no final de uma tarde, Miguel estava andando pela rua, com a cabeça baixa, como se não tivesse expectativas para a vida, como se já estivesse conformado de que nada que ele fizesse iria dar certo, como se o azar tivesse cruzado o caminho dele e a vida dele fosse feita só para reclamar. Continuou andando pela calçada até chegar numa praça. Ali, algo lhe chamou atenção, havia um aglomerado de gente. Curioso, se aproximou para ver o que estava acontecendo.
  Era um coral de cadeirantes. Ele ficou ali olhando, apreciando aquelas pessoas cantarem com tanta garra e dedicação. Mesmo que eles tivessem dificuldade para se movimentar, os sorrisos estavam estampados nos rostos sem nenhum esforço. Ele começou a ouvir a letra da música, era um poema de Charlie Chaplin que dizia assim:
  "Hoje levantei pensando no que tenho a fazer antes que o relógio marque meia noite. É minha função escolher que tipo de dia vou ter hoje. Posso reclamar porque está chovendo ou agradecer às águas por lavarem a poluição. Posso ficar triste por não ter dinheiro ou me sentir encorajado para administrar minhas finanças, evitando o desperdício. Posso reclamar sobre minha saúde ou dar graças por estar vivo. Posso me queixar dos meus pais não terem me dado tudo o que eu queria ou posso ser grato por ter nascido. Posso reclamar por ter que ir trabalhar ou agradecer por ter trabalho. Posso sentir tédio com o trabalho doméstico ou agradecer a Deus. Posso lamentar decepções com amigos ou me entusiasmar com a possibilidade de fazer novas amizades. Se as coisas não saíram como planejei posso ficar feliz por ter hoje para recomeçar."
  Quando a música terminou, os olhos de Miguel estavam cheios de lágrimas. Aquela letra, aquele poema em forma de música tocou-lhe profundamente. Enquanto ele tirava um lenço do bolso para enxugar as lágrimas, uma jovem cadeirante foi um pouco a frente e começou a falar:
  - Eu não era assim, eu era dançarina. Adorava o que fazia: mover-me com as pernas. Era o meu maior meio de comunicação com o mundo. Um dia fui atingida por uma bala perdida e perdi o movimento das pernas. Fiquei me perguntando: Por que a vida fez isso comigo? Eu tinha uma carreira, mas agora não podia fazer o que eu mais gostava. Fiquei um bom tempo querendo saber o que tinha eu feito para merecer essa situação, me torturando e sofrendo com as possíveis respostas. Até que um dia eu vi que para ser feliz de novo era preciso parar com as perguntas, agradecer a Deus por está viva e seguir em frente. E hoje eu sou feliz assim, cantando.
  Quando a moça terminou de falar, Miguel novamente começou a se desmanchar. Ele começou a pensar que tinha perdido muito tempo da vida só vendo o lado ruim dela, ele nunca havia parado para ver o lado bom das coisas.
  Por isso, de que adianta viver de tantas reclamações? Isso só torna a vida mais longa e chata. Bom mesmo é uma vida curta e cheia de emoções, aventuras e sentimentos. Então expulse o mau humor, adote a alegria como um dom e veja em tudo um lado bom. Faça como Miguel que colocou o final do poema de Chaplin no vidro de traz do carro dizendo:
  "O dia está na minha frente esperando para ser o que eu quiser. E aqui estou eu, o escultor que pode dar forma. Tudo depende só de mim."

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